quinta-feira, junho 14, 2012

Luísa

Luísa, de uma mulher mais velha já não se esperam sonhos inocentes e ideias loucas. De uma mulher mais velha já não se espera um amor puro e inocente e cabeça nas nuvens, senão a amorizade consciente e de pés bem assentes no chão.

E Luísa, de quarenta e três anos, tinha sido inocente. ela tinha sido pura. ela tinha sido apanhada de surpresa.

com a idade que tinha.

E sentia-se ridícula. Ridícula no mais puro sentido da palavra. "Ridícula, a. f., que é alvo de risos." Humilhada, traída, espezinhada.

um nada.

Atirou-se de cabeça e estatelou-se no chão após um curtíssimo período de ar.

Mas a vida é um voo que só termina quando se morre.

e os silenciamentos e anulações nunca funcionam por muito tempo.

E Luísa havia de voar de novo até se estatelar sempre e cada vez mais nos seus próprios medos e menos nas coisas que lhe aconteciam. O inferno são os outros, diria Sartre. Mas o seu inferno era ela mesma. Que se empurrava além da sua zona de conforto nas situações de risco e que se repreendia muito duramente, na voz das tias mesquinhas e madrastas, quando as coisas corriam mal.

Quando Luísa se queria mesmo martirizar, dizia a si mesma que tinha muita bagagem emocional, que já tinha passado por demasiado para poder agora ser feliz.

Dizia-se que o peso da sua bagagem era grande.

e que não se podia libertar dela.

E enquanto estava no fundo do poço, Luísa chorava quase até se afogar.

Mas levantava-se invariavelmente e respondia às suas próprias críticas dizendo que ninguém faz grandes viagens sem levar bagagem.

E desta vez não ia ser diferente.

Porque de que serve afinal acumular bagagem, se não for para se viajar cada vez mais longe?

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