segunda-feira, outubro 25, 2010

Sr. Zé

O bêbedo cumprimentou-o e estendeu-lhe a mão. Caninho, o bêbedo local conhecido de todos, tinha um ar sujo, cheirava mal e falava alto.

José recusou o cumprimento, enxotando-o.

"Ai não me conheces?" perguntou o bêbedo fingindo indignação, como se estivesse a representar uma paródia.
"Não.", respondeu o outro secamente.
"Ah, não me conheces... Deixa estar que quando quiseres um copo..." - e pausou propositadamente enquanto o rosto do outro se transfigurava, passando do nojo e da superioridade à súplica - "em vez de 1, trago-te 2!", concluiu de forma marota e sentou-se noutra mesa.
"Deixa-te estar!...", continuou Caninho, troçando e falando alto enquanto se reclinava na cadeira vermelha de plástico na esplanada, provocando o incómodo de um apologético José.

Caninho era uma figura local. Tinha a roupa escura empoeirada, pontuada por nódoas de gordura e vinho tinto; trazia um saco de plástico preto fechado com um nó e um boné beije encardido de suor e pó com a pala para trás.

"Menina!" - chamou José pela empregada de café
"Diga, Sr. Zé" - respondeu a jovem a partir da soleira da porta do café.
"Venha cá."
"Pode falar daí." - disse com inamovível indiferença.
"Queria um copo de vinho branco."
"E depois?"
"Traga-me um copinho de vinho branco...", suplicou com voz sumida.

A jovem abanou a cabeça, recusando, e foi para dentro, sem mais. Como já era hábito, negava-se servir-lhe o pedido sem mais justificações ou palavras.

E José deu por si na situação ingrata do costume.

"Caninho! Eh! Caninho!" - dirigiu-se ele ao bêbedo - "Vai-me lá a dentro buscar um copo..."

Caninho levantou-se e, contrariando a atitude que ostentava até então, dirigiu-se ao Sr. Zé rapidamente com um ar sério, como fazem os cúmplices das ilicitudes enquanto perpetram o acto.

O Sr. Zé entregou-lhe dinheiro para 2 copos (o dele e o do comparsa) e esperou ansiosamente pelo primeiro gole do copo ilícito.

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