Perder um filho não é uma coisa natural, é o que mais violentamente vai contra a nossa natureza: por algum acaso temos uma palavra para quem perde os pais, mas a própria Língua se recusa a legitimar a violência atroz que é perdermos o ser que nos veio das entranhas.
Luis e Mariana choraram a perda da filha pequena e toda a gente lhes disse que eram novos, que haviam de ter outros filhos, que com o tempo a dor havia de diminuir.
Mentiram.
Apesar de terem tido mais dois filhos, Luis e Mariana nunca deixaram de sentir a falta da mana mais velha dos outros petizes, nunca a substituiram e nunca se esqueceram dela por um momento que fosse. Sara nunca deixou de lhes fazer falta; a sua falta só se tornou mais visível com o passar do tempo.
É um processo inexplicável e muito pouco aceite socialmente.
É suposto que as pessoas chorem muito quando lhes morre alguém querido e que depois com o passar do tempo se acostumem à sua ausência. De vez em quando podem recordar-se de algo mais específico, mas não é particularmente bem visto que as pessoas se delonguem demasiado no seu luto.
Mas para Luis e Mariana, cuja ferida nunca haveria de fechar, esta noção era simplesmente incompreensível.
E portanto, toda a vida os seus outros filhos ouviriam falar da mana mais velha, haveriam de ver-lhe as fotografias, haveriam de dizer que na família eram 5, eles os 4 mais a mana que era uma estrelinha.
E assim a vida prosseguiu, num destes paradigmas de família moderna.
Se há famílias monoparentais, casais do mesmo género, etc., a sua família haveria de ser uma destas que fogem à regra.
E como tal, mais do que eles os 4, a sua família havia sempre de contar com mais um, por muito que fisicamente não estivesse e não entrasse para as contas do IRS.
Sara morreu, mas não nos seus corações e nunca na sua família.
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