(personagem construída para o Projecto Curta Metragem)
Susana limpava o estúdio sem grande brio, mas com um rigor mecânico. Tinha 19 anos e trabalhava nas limpezas havia 5. Nunca fora boa aluna, mas a mãe só a tirou da Escola porque certo dia lhe ligaram para o trabalho por um engano ou uma partida maldosa, dizendo que Susana tinha dado entrada no Hospital.
Alzira deixou tudo e foi a correr ter com a filha, que não estava no Hospital. Ainda muito preocupada decidiu ir à Escola confirmar com os seus próprios olhos que Susana estava bem. Mas Susana, apesar de ter a mochila na estante da escola secundária, não estava na edifício e tinha faltado às aulas toda a manhã.
Alzira tinha problemas de coração. E sentiu a taquicardia doer-lhe no peito quando percebeu que Susana podia de facto estar em apuros.
Na altura não havia telemóveis e Alzira ficou sem saber o que fazer, desesperada. Uma auxiliar deu-lhe um chá e a Presidente do Conselho Diretivo sugeriu que fosse para casa e tentasse ligar às amigas da filha.
No dia seguinte soube-se que Susana e outras duas amigas tinham passado o dia em casa de uma delas, a embebedarem-se, e os colegas nunca mais a veriam.
Susana tinha sido levada para casa pelo pai da amiga em cuja casa estavam, bebeda até à inconsciência. A mãe sovou-a na mesma, até se sentir ressarcida do mal que tinha passado nesse dia. e tirou-a da escola, já que ela de qualquer forma não estava a aproveitar o esforço que a mãe, viúva e sem grandes possibilidades, estava a fazer por ela.
A partir de então começou a trabalhar como ajudante num cabeleireiro e a ajudar a mãe nas limpezas que fazia aos dias.
Rigidamente controlada por Alzira (que decidira que não podia confiar na filha) durante a maior parte da adolescência, Susana ambicionava mais que tudo fazer 18 anos. Aos 16 começou a trabalhar para uma senhora que gostava muito dela e lhe arranjou uma cunha para ir para a empresa onde estava agora, em que, apesar de ganhar menos do que faria independentemente, sempre tinha um contrato e direitos.
O sonho dos 18 anos era a liberdade. Era o ser "maior de idade", poder fazer o que lhe apetecesse.
E Susana cumpriu o seu preceito.
Quando fez 18 anos e se tornou coincidentemente o principal ganha-pão da casa porque a mãe teve de pedir uma pensão de invalidez dada a sua condição de cardíaca que se agravava, informou que a partir daí era dona do seu próprio nariz e que a mãe não mais a iria controlar. Que pretendia sair e divertir-se muito e que a mãe não tinha nada, mesmo nada a ver com isso.
E Alzira não teve outro remédio senão conformar-se. Valeriam a Susana os anos de inflexível disciplina e intransigência da mãe o resto da vida, onde acima de tudo se obrigava a cumprir as suas tarefas, independentemente do quão bebeda tivesse chegado na noite anterior a casa ou das horas da madrugada a que chegasse.
Mas a amargura de sentir o futuro roubado e o rancor pela ausência de compaixão perante uma estupidez da adolescência por parte da mãe nunca mais a abandonariam também.
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